Recentemente prestei uma consultoria para um evento
gastronômico sugerindo alguns vinhos para serem degustados. A
harmonização mais importante deveria contemplar o prato principal,
escalopes de filet ao molho de shitake fresco e champignon, com um tinto
adequado. A empresa encarregada de fornecer os vinhos ofereceu uma
relação com vinhos portugueses do Douro e do Alentejo, Cabernet
Sauvignon do Chile e da Argentina, além de duas opções de Malbec.
Eram bons vinhos, mas muito “pesados”
para um prato que, apesar da carne, é leve. Qualquer um deles
sobressairia, escondendo os delicados sabores do molho. Sugeri como
alternativa, um vinho baseado na casta Merlot, o que provocou uma reação
de surpresa por parte dos interessados, deixando a sensação que esta
nobre casta anda meio esquecida. Mas não deveria ser assim, seus vinhos,
invariavelmente, são muito fáceis de beber e agradam aos mais ecléticos
paladares.
Preferências à parte, a Merlot é uma das
principais varietais dos vinhos de Bordeaux. Na margem esquerda do Rio
Gironde, é vista como uma consorte: por ser uma uva mais suave e menos
tânica, é usada para domar as características mais agressivas da
Cabernet Sauvignon. Na margem direita, principalmente em St. Emilion, o
quadro se inverte: ícones como Petrus ou Cheval Blanc são elaborados a
partir dela.
Então, de onde vem este ostracismo ou desprezo, embora continue firme em Bordeaux?
Vários fatores contribuíram para isto.
Nascida e criada na França, a versátil Merlot foi transportada para
diversos países com ótimos resultados quando vinificada, gerando
deliciosos varietais ou cortes. Vinhos tão saborosos e agradáveis que se
tornaram mania em alguns países das Américas, como nos Estados Unidos,
onde houve uma verdadeira avalanche de garrafas de bons vinhos elaorados com ela. No nosso país houve uma tentativa para torná-la a nossa uva
emblemática, nos mesmos moldes da Carménère, da Malbec, do Tannat ou da
Touriga Nacional. Nossos melhores caldos são elaborados com esta variedade de uva.
Infelizmente esta superexposição ou massificação
acabou por gerar efeitos colaterais indesejados como, qualidade
duvidosa, excesso de oferta e preços ridiculamente baixos,
descaracterizando a nobreza desta casta. Para complicar um pouco
mais, um dos primeiros filmes sobre o universo do vinho, que obteve sucesso
em todo o mundo, o “Sideways – Entre umas e Outras”, tentou liquidá-la:
Miles, um dos protagonistas, afirmava que Merlot não era vinho.
O impacto foi sentido na vinicultura
americana, houve uma notada queda na venda destes vinhos, muito embora
houvesse uma pegadinha quase no final da narrativa: para Miles, o
melhor vinho de sua adega era o mítico Cheval Blanc, um belíssimo corte
de Merlot com um quase nada de Cabernet Franc. Esta preciosa garrafa acaba sendo usado para curar um momento de depressão, num
copo de isopor e acompanhado de um hambúrguer de lanchonete...
No Chile, um dos grandes produtores desta
casta atualmente, os vinicultores acreditavam na existência de uma
mutação da Merlot que amadurecia mais tarde. Coube ao ampelógrafo
francês Jean-Michel Boursiquot desfazer o engano ao descobrir que eram
parreiras da extinta Carménère.
O nome Merlot seria o diminutivo, em
francês, de Melre (Melro, em português), talvez por causa de sua cor escura.
Carinhosamente chamada de “pequeno pássaro”, produz vinhos exuberantes,
apetitosos e aveludados, em contraste com sua rival, Cabernet Sauvignon,
com seus firmes e poderosos taninos. Em Bordeaux, uma não vive sem a
outra,
Dica da Semana: Que tal um excelente Merlot?
Casa Lapostolle Merlot 2012
A uva Merlot é uma das grandes especialidades da Casa Lapostolle, mostrando grande caráter varietal e profundidade.
Uma das escolhas mais "sólidas" para a Wine Spectator, este saboroso tinto é elegante, macio e bem equilibrado.
Robert Parker elogiou o corpo "concentrado e harmonioso, com taninos soberbamente maduros".
Premiações: Wine Spectator: 87 pontos (safra 07); Robert Parker: 88 pontos (safra 02).

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