sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Mendoza 2014 – 3º dia

Nosso último dia em Mendoza seria mais curto, pois o voo de retorno à Buenos Aires era às 17:00. 

Parte do grupo voltaria no mesmo dia para o Rio de Janeiro enquanto minha esposa e eu, Lu e Gustavo esticaríamos um par de dias na capital da Argentina.

Seriam duas visitas somente. Na primeira, descobrimos o que é uma “vinícola ecológica”, a Bodega Dolium.


A foto mostra o que está sobre o solo, apenas o pequeno restaurante/sala de degustação e os escritórios. A parte de produção está enterrada cerca de 14m no subsolo.

Mostramos, na coluna anterior, algo parecido na Bodega Sin Fin, que colocou embaixo do solo as áreas de entretenimento, loja e degustação. Na Dolium isto foi invertido.
A ideia por trás deste curioso projeto é minimizar o consumo de eletricidade e diminuir emissões ou, no jargão dos ecologistas, reduzir a pegada de carbono (carbon footprint). 

Interessante notar que esta empresa não trabalha com cultivo orgânico ou biodinâmico nos vinhedos, apesar de serem opções dentro da mesma linha ecológica.

As fotos, a seguir, foram tiradas de um mesmo ponto mostrando o lado esquerdo e o direito: está é toda a área de produção. Fazia muito frio lá embaixo, mesmo a nossa guia, que é mendocina e estava bem agasalhada, não aguentou o frio neste ambiente. 
Resumindo: custo zero para manter o processo em baixa temperatura. Os tanques são simples, não usam qualquer tipo de controle de temperatura. Emissões nulas. Neste aspecto é formidável!


Retornamos para a sala de degustação para uma experiência bem diferente do que nos fora oferecido até agora nas outras vinícolas: uma prova comparativa. 

Os vinhos seriam servidos aos pares para que pudéssemos perceber as diferentes nuances entre formas de elaboração, castas, vinhedos, etc.


A Dolium trabalha com algumas linhas de produtos que começam com a denominação Andes Peak, de viés ecológico, passa pela linha Clássica e termina com os Reserva e Gran Reserva. 

Nesta degustação experimentamos um rosé jovem e outro envelhecido em carvalho; dois Malbec de diferentes regiões, Lujan e Uco, além de um Tempranillo em confronto com um Cabernet Sauvignon. Ao final, dois vinhos top de linha foram servidos.

Toda esta ação foi comentada pelo nosso anfitrião que sempre se interessava pelas nossas escolhas. Diferente e esclarecedor.


A última visita do dia foi realmente um “Gran Finale”. 

Embora já conhecêssemos os vinhos da Domínio del Plata (Suzana Balbo), nem em sonhos poderíamos imaginar o que nos aguardava neste deliciosos almoço harmonizado no restaurante da vinícola, o “Osadia de Crear”. (faz jus ao nome...)


Vários aspectos nos chamaram a atenção: um ambiente elegante e acolhedor, a tradicional atenção com que somos recebidos nas vinícolas, a qualidade dos vinhos que seriam servidos e um cardápio cheio de alternativas entre o tradicional e o ousado. 

Cinco passos e cinco vinhos, com opções para os não carnívoros, o que gerou um interessante debate.  


A primeira etapa foi regada pelo sempre bom Chardonnay 2012 da linha Crios. Para harmonizar foi servido um Escabeche de Coelho sobre uma Foccacia de Azeitonas. Equilíbrio correto e delicioso.


O próximo prato foi uma releitura de tradições locais, a Molleja ou glândula Timo dos bovinos, muito apreciada nestas terras. A apresentação era diferente: empanada e colocada num espetinho, acompanhada de cebolas caramelizadas, purê de batatas e alguns verdes. 

O vinho era o Crios Red Blend 2012, um corte de Malbec, Bonarda, Syrah e Tannat. 

Um verdadeiro festival de sabores e aromas que preparou o palato para o próximo passo.


Como a estação era supostamente fria, o prato seguinte foi uma sopa de Sobreasada, um embutido de carne de porco levemente picante. Uma harmonização sempre difícil, mas o bom Ben Marco Malbec 2012 cumpriu com galhardia o seu papel.

Para a próxima etapa havia duas opções: com ou sem carne. Cada uma seria acompanhada por um vinho diferente.

Obviamente a grande maioria partiu para o bife de Aberdeen Angus (raça bovina com carne muito macia) acompanhada do típico creme de milho à moda Cuyana (humita). 

O vinho servido foi o Ben Marco Expresivo 2013, muito bom por sinal e que proporcionou excelente casamento com o prato.


Para os que estavam mais atentos e optaram pelo prato sem carne, uma ótima surpresa estava reservada. Entra em cena o que muitos consideram como o vinho top da casa, o Susana Balbo Brioso 2012, pouco divulgado no nosso país por ter uma produção limitada.

Acompanhando este magnifico vinho, foi servido um elaborado Gnocchi feito com as borras do Brioso, com um pesto vermelho, cogumelos refogados e queijo defumado.

Supimpa! 

Não poderia ser melhor. 

Perfeito! 

(O mais complicado foi desviar os garfos e bocas alheias ao meu prato e vinho!)


Para terminar, foi servida a interpretação da casa sobre o que deve ser a dobradinha “doce com queijo”, harmonizada com um Susana Balbo Late Harvest Malbec 2011.  


Equilíbrio inacreditável, todos gostariam de repetir, mas era hora de partir. Ainda passaríamos por algumas peripécias no aeroporto, todas resolvidas a tempo.

Na próxima coluna comentaremos sobre Buenos Aires e alguns episódios curiosos que não se encaixaram neste relato dos 3 dias.


O grupo, da esquerda para a direita: María José, nossa Guia, Diretora da Divinos Rojos (www.divinosrojos.com.ar) e organizadora das visitas; eu, minha esposa; Gustavo e Lu; Lobianco; Fabio; Marcio e Ronald.

Dica da Semana:  como o Brioso já foi sugerido numa dica mais antiga, indicamos outro bom vinho desta vinícola.

Ben Marco Expresivo
Corte de 55% Malbec, 15% Bonarda, 10% Cabernet Sauvignon, 10% Syrah e 10% Merlot, oriundos de vinhedos em Agrelo, Chacras de Coria (Luján de Cuyo), Los Arboles (Tupungato) e La consulta (San Carlos) com idade média de 36 anos em pés francos.
Apresenta aromas de groselhas, carvalho e baunilha com notas defumadas de cacau, noz-moscada e chocolate. Taninos elegantes.
Acompanha carnes, queijos fortes e molhos intensos.
Tempo de guarda de 10 a 15 anos

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Mendoza 2014 – 2º dia

A jornada começou cedo, às 8:30 já estávamos a bordo da van a caminho de Maipu e Lujan onde visitaríamos outras três vinícolas. 

A primeira, Domaine St. Diego, do renomado enólogo Angel Mendoza, foi um dos pontos altos desta viagem.

Ao contrário da grande maioria das visitas, destinadas a turistas, que enfatizam a arquitetura, a modernidade e a tecnologia e ainda oferecem um elaborado almoço conduzido por um grande Chef, esta pequena vinícola, estritamente familiar, conduz os visitantes unicamente por seus vinhedos, todos localizados dentro da propriedade de apenas 3,3 hectares. 

Cada metro quadrado está ocupado, seja pelas parreiras e oliveiras (produzem azeite também), pela bodega ou pela casa da família. Só por isto a visita já toma um caráter único. Quem nos acompanhou foi Laura, filha do proprietário, que não poupou informações e nem deixou pergunta sem resposta. 

Como não dispõem de muito espaço, empregam técnicas de plantio ousadas, como a “espaldeira dupla” que utiliza duas alturas diferentes para as plantas, dobrando a capacidade do espaço disponível e exigindo, em compensação, o dobro de trabalho para manter e colher (são duas colheitas – as uvas amadurecem em diferentes períodos) ou a condução em “Globelet” ou arbusto, em busca de sabores e aromas únicos para seus vinhos. 

Até as suaves encostas que cercam a propriedade estão plantadas, nada é desperdiçado.


Mais importante que a utilização racional do solo, a otimização do uso da água, rigidamente controlada neste distrito de Lulunta, é fundamental. Aqui não há água de subsolo. Tudo que conseguem vem do degelo dos Andes distribuído através de um sistema de diques, canais e comportas, criados pelos índios Huarpes que aprenderam a técnica com os Incas.

Atualmente a distribuição é controlada por um “Tomero”, pessoa encarregada de alimentar os diversos canais de distribuição e operar as comportas de cada consumidor de acordo com um contrato de fornecimento muito simples: paga-se por um determinado número de horas, por período. Se precisarem de mais água devem esperar pela próxima data. 

Quase uma dosagem “homeopática”. Laura nos mostrou a comporta. Difícil imaginar que com tão pouca água consigam produzir vinhos estupendos.


Angel Mendoza, proprietário e enólogo tem como filosofia a ideia de ‘colher o vinho’ em lugar de produzi-lo. Acredita que deveria se dar maior importância às videiras, obtendo-se um bom vinho no terreno em vez de corrigir os erros na cantina. 

Para comprovar esta máxima, somos convidados para a degustação dos seus produtos, que acontece na casa da família. Nada de salas especiais com iluminação estudada e outros requisitos sofisticados e mercadológicos. Apenas uma varanda envidraçada, com vista para os vinhedos, amplas mesas e cadeiras plásticas, toalhas brancas cobertas de plástico transparente é tudo o que precisam para, neste momento, nos encantar com seus vinhos e azeite. 

Simplicidade é o segredo!


Começamos com o bom azeite Almazara, obtido com a azeitona Arauco, seguido do quase exclusivo espumante Brut Rosé Elea. 

Aprovação incondicional.

O vinho seguinte, Paradigma, foi uma surpresa para todos. Elaborado a partir das uvas plantadas como arbustos, o que permite uma maturação diferente. Um formidável corte de Malbec, Cabernet Franc e Cabernet Sauvignon que não passa por madeira. 

Eu diria que “nem precisa”!

Se houve, nesta viagem, um vinho que nos intrigou, foi este. Aromas e sabores deliciosos que poderiam confundir até mesmo um bom enófilo. 

O seu nome decorre disto, um verdadeiro paradigma. Por que recorrer a técnicas mirabolantes ou desconhecidas quando tudo que é necessário para obter um grande vinho é olhar para a terra. Um verdadeiro vinho de terroir que derruba, sem piedade, qualquer outra teoria. 

Esta é uma das razões, pelas quais, Angel Mendoza é respeitado entre seus pares. 

Espetacular.

Os dois outros vinhos degustados, Pura Sangre e Pura Sangre Nueve Lunas, também eram fora de série, mas não conseguiram nos fazer esquecer o intrigante Paradigma.


Quase ao final da prova de vinhos recebemos a simpática e esfuziante visita de Angel. Encantou a todos com sua simplicidade e franqueza desconcertante. 

Teve a delicadeza de elogiar e recomendar que consumíssemos mais os nossos próprios vinhos, principalmente os de Santa Catarina, Santana do Livramento e Campanha Gaúcha. Ganhou uma legião de fãs com direito a fotos e autógrafos!


Esta vinícola tem uma interessante característica: seus produtos são comercializados unicamente “in loco”. Não tem representantes comerciais nem importadores. Se alguém quiser revendê-los tem que comprar lá primeiro. 

Com isto, a nossa van saiu carregada...

Nossa próxima parada foi na Bodega Sin Fin, um projeto inovador segundo a nossa guia, Maria José. Por termos passado da hora prevista, ficamos apreciando a paisagem ao redor, aguardando o fim da visita de outro grupo. 

Uma empresa relativamente pequena e pouco conhecida, mas tinha um Ás escondido na manga: o importante não estava ao alcance dos olhos...


Ao ingressar no prédio da foto, somos apresentados a uma pequena história da família e da empresa que, por longos anos, se dedicou ao cultivo de uvas e depois da produção de vinhos a granel que são revendidos a outras vinícolas. Só muito recentemente entraram para o segmento dos vinhos próprios.

O tema foi exposto e a pergunta veio rapidamente: quem compra o vinho a granel? A resposta pegou todos no “contrapé”: principalmente vinícolas francesas... 

Nosso anfitrião recomendou que olhássemos com muita atenção os contra rótulos de alguns vinhos em busca de uma informação como “produzido por: 1234567890”, em letrinhas muito miúdas. Esta seria uma indicação que o vinho, naquela garrafa, teria outra origem.
Interessante: vinhos argentinos “en bouteille”!

Embarcamos em um elevador para acessar o subsolo e descobrir mais surpresas escondidas. Ao abrir a porta nos deparamos com um ambiente de raro bom gosto e muito aconchegante. 

Estávamos sob a área de produção, onde criaram um espaço cultural que recebe shows, peças de teatro ou exposições de arte, uma loja de vinhos e de decoração de alto nível, a simpática sala de degustação e uma micro sala de barricas onde estava toda a produção.


A sequência de degustação foi bem tradicional iniciando com um espumante, seguido de 1 branco e de alguns tintos. Todos corretos. O ponto alto ficou com o Sauvignon Blanc que apresentou um estilo totalmente “velho mundo”, sendo o vinho que mais agradou a todos.

Fizemos mais uma preciosa descoberta: quais os rótulos que devemos ficar mais atentos.


Uma boa visita, mas sem fortes emoções que estavam reservadas para o premiado almoço na Melipal, conduzido pelo Chef Lucas Bustos, reconhecido como um especialista em harmonizações. 

Vejam o cardápio de 5 passos:

1º - Terrina de frango e figos secos ao sol, com geleia de marmelo;
- vinho Ikela Merlot;

2º - Crocantes de beterrabas com pesto de tomates secos e “tartar” de carne bovina;

- vinho Ikela Cabernet Sauvignon;

3º - Creme de Lentilhas e “funghi” de pinheiro, servida sobre panceta defumada e croutons;
- vinho Melipal Malbec (100% Malbec com 12 meses em barricas de carvalho 
francês);


4º - Medalhão de Filé, purê de batatas de Ugarteche (uma localidade), vegetais da época e Chimi Churry de tomates assados;
- vinho Melipal Nazarenas Vineyard Malbec (100% Malbec do vinhedo Nazarenas, plantado em 1923 e 18 meses em barricas de carvalho francês);


5º - Trufa de chocolate amargo e Amaranto, frutas grelhadas e molho de laranja;
- vinho Melipal Malbec Colheita tardia.


A melhor descrição que posso dar a este almoço é: “uivos diversos”!

O Crocante de Beterrabas foi uma unanimidade: delicioso!

Um ambiente maravilhoso, pratos saborosos com apresentação primorosa e vinhos de alto nível. Ficamos no restaurante até quase o fim de tarde, aproveitando o belo visual e o clima ameno. 

Quase nos expulsaram...


Dica da Semana:  um dos bons vinhos servidos neste almoço.

Melipal Malbec
Melipal é o nome da constelação Cruzeiro do Sul no idioma dos Huarpes. Apresenta coloração vermelho rubi com reflexos violeta.
No olfato mostra aromas intensos de ameixas, cerejas pretas, frutos e nozes. No palato percebe-se frutos vermelhos e especiarias com taninos firmes e persistentes.
Harmoniza com carnes vermelhas, lombo de porco e queijos curados.
91 pontos de Robert Parker


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Mendoza 2014 – 1º dia

Já estava na hora de retornarmos à capital dos vinhos da Argentina e nos atualizarmos. A grande novidade é que seriamos acompanhados por um grupo de seis amigos: Ronald, Marcio, Fabio, Lobianco e o casal Gustavo e Lu. 

Partimos do Rio numa 5ª feira em voo direto para Buenos Aires de onde embarcamos para Mendoza. Foi um dia inteiro de viagem chegando já de noite em nosso destino.

Para este dia não passar em branco havíamos programado um jantar de boas vindas num dos excelentes restaurantes de alta culinária, o Anna Bistró, com um variado cardápio e excelente adega. A tônica, obviamente, foram os pratos à base de carne com algumas pedidas de massa. 

Para harmonizar, abrimos os trabalhos com o Petite Fleur da vinícola Monteviejo. Duas garrafas foram consumidas rapidamente devido à baixa temperatura da cidade e à “sede” do grupo.


O segundo vinho servido com a chegada dos pratos foi o excelente Bressia Profundo, categoria Premium, nitidamente superior ao primeiro. Para finalizar brindamos com um dos bons espumantes da nova geração, o Cruzat, e fomos descansar, no dia seguinte iniciaríamos uma maratona de vinícolas e almoços harmonizados que se estenderia até Domingo.


6ª feira


Nosso roteiro de 3 dias, organizado pela Divinos Rojos (www.divinosrojos.com.ar – María José), foi montado sobre a ideia de conhecermos os terroirs mais importantes: Vale do Uco, Lujan de Cuyo e Maipu. 
Neste dia nos deslocamos para Tupungato, um dos distritos dentro do vale, para visitar o empreendimento Clos de Los Site, um consórcio de vinhedos e vinícolas de diversos proprietários franceses, comandado pelo famoso enólogo Michel Rolland.


São 5 empresas: Menteviejo, Flecha de Los Andes, Cuvellier de Los Andes, Diamandes e Rolland Collection. Visitamos estas duas últimas.


A Diamandes impressiona por sua premiada arquitetura. Um prédio muito bem estudado que cumpre as funções de integrar com a bela paisagem e ser perfeitamente funcional para a atividade que se propõe. Vejam as fotos a seguir e tirem suas conclusões.


Após esta visita seguimos para a vinícola de Michel Rolland, um contraste impressionante, era apenas um rustico galpão, apelidado de “Concrete Box” (caixa de concreto) que nada tinha de charmoso, pelo contrário, era uma forte presença afirmando claramente: aqui se produz (excelentes) vinhos.


Fomos recebidos pelo enólogo chefe, o simpático Rodolfo Vallebella. Mais que uma bodega, aqui é um laboratório onde são testadas as mais recentes inovações na arte de produzir vinhos. Tudo é muito simples e direto, sem frescuras. A imagem abaixo mostra a atual tendência, um “ovo” de concreto onde o vinho é produzido e amadurecido.


Seguimos para a sala de barricas onde seria feita a degustação. 

A sequência começou com um Sauvignon Blanc em fase final de produção, retirado diretamente do tanque de aço inoxidável, seguido de Pinot Noir, Merlot, Malbec e terminando com o excepcional Camille, dedicado para a neta de Rolland. 

Este é um produto fora de série elaborado com um cuidado redobrado que inclui especialíssimos barris de carvalho montados com madeira de mais de 200 anos (foto). 

Tudo o que foi servido veio das barricas, nada em garrafa. Segundo o enólogo, esta é a forma correta de se visitar uma bodega. Vinho engarrafado qualquer um prova...

Observação registrada!


A sequência preparada por Rodolfo nos mostrou diversas possibilidades e foi altamente instrutiva: vinhos jovens, Malbec de diferentes vinhedos e vinhos de sonho. Valeu a pena!


O dia terminaria num delicioso almoço harmonizado preparado na Finca Blousson (finca = vinhedo) do simpático casal Victoria e Patrick, dois Portenhos que praticamente largaram suas atividades de origem (áreas financeira e de sistemas) e se mudaram para Mendoza para plantar uvas e, um dia, fazer vinhos.


Sem dúvida que o projeto é muito sério, lá estão 2 “ovos” já em pleno funcionamento com a assessoria de Matias Michelini, um dos bons enólogos argentinos.


Eis o cardápio do almoço e os vinhos servidos, todos muito exclusivos:


Recepção:


Empanadas de carne;
Vinho: Espumante Rosé Laureano Gomez;


Entrada: Sopa de cebolas ao Gruyere;
Vinho: Sabato Cabernet Sauvignon (Susana Balbo);


Prato Principal: Cordeiro no Forno de Barro com verduras assadas;
Vinho: Montesco Parral (Passionate Wine/Matias Michelini);


Sobremesa: Torta de maçãs com sorvete;


Café/Chá/Licor de Malbec (Artesanal Finca Blousson).


O melhor vinho, minha opinião, foi o Montesco Parral que merece um comentário: Parral significa Latada ou Pérgola, um sistema de condução da parreira em franco desuso. Michelini não só descobriu um vinhedo assim em Mendoza como o recuperou e produziu um belo vinho, mostrando que este tipo de arranjo para as vinhas ainda tem seu lugar. 

O sistema mais usado é a Espaldeira. Comparem as fotos:


Já estava escuro quando retornamos ao nosso hotel.


Dica da Semana:  não poderia ser outro, mas não é figura fácil por aqui.


Montesco Parral 2012

Elaborado a partir de 40% Cabernet Sauvignon, 30% Malbec e 30% Bonarda de vinhedos de mais de 30 anos plantados em latada, com estágio de 12 meses em barricas de carvalho francês e americano.

Bem estruturado e encorpado, com estilo vibrante e com acidez refrescante, envolto por taninos de textura quase granulada. Consegue aliar opulência e austeridade.

94 pontos em 2010 e 90 pontos em 2012 (Parker).



P.S.: só para constar, este vinho nas lojas em Mendoza ou em Buenos Ayres custa 140 pesos, algo como R$ 28,00 pelo câmbio paralelo...

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Defeitos comuns no vinho

Por ser um produto em constante evolução, o vinho pode ser atacado por diversos males que acabam por destruir suas boas qualidades. Um bom enófilo certamente já encontrou defeitos ao abrir uma estimada garrafa. Quase sempre o destino é o lixo.
Alguns defeitos têm origem no próprio manuseio (inadequado) da uva, outros na fase de elaboração ou mesmo durante o armazenamento. Vamos descrever os mais comuns.
1 – Vinho “bouchonné” ou com cheiro de rolha
Muito fácil de ser reconhecido até por enófilos principiantes, pode ser descrito como um aroma de papelão úmido ou como preferem alguns críticos de língua ferina “cheiro de cachorro molhado”. Isto decorre da presença de TCA ou Tricloroanisol. Este composto ataca as rolhas e as barricas de envelhecimento produzindo o desagradável odor.
Nada a fazer se encontramos uma garrafa contaminada: jogue pelo ralo da pia. Nem para cozinhar serve...
2 – Vinho avinagrado
Sabemos que a palavra vinagre deriva da expressão francesa “vinaigre” que significa vinho agre ou azedo. Um vinho avinagrado foi contaminado pela bactéria “mycoderma aceti” conhecida como “vinagre mãe”. Isto decorre por baixa higiene na cantina ou por guarda incorreta associada à rolhas de baixa qualidade: nem todo o vinho serve para ser guardado.
Assim como no caso anterior, descarte...
3 – Aroma de “ovos podres” e similares
Este defeito denominado “redução” tem origem na presença acentuada de compostos à base de enxofre (mercaptanos), muitos deles usados como conservantes. Alguns autores descrevem este aroma como fósforo ou borracha queimada. A origem pode estar ligada ao excesso de sulfeto de hidrogênio usado na preservação do vinho ou por más condições de higiene durante a trasfega do vinho entre as diferentes fases de elaboração.
Segundo alguns especialistas, seria possível recuperar um vinho neste estado fazendo uma prolongada decantação em contato com uma ou duas moedas de cobre até que o aroma desapareça. Há um risco...
4 – Vinho oxidado
Este defeito pode ser descrito como o oposto do anterior. Em lugar do olfato, vamos precisar da nossa visão para identificar o problema: uma coloração quase laranja, sem brilho. Líquido velado. Em certos casos cheira a mofo ou coisa velha.
Isto é resultado de uma guarda excessivamente prolongada onde a rolha ressecou e houve uma indesejada entrada de ar na garrafa. O vinho morreu.
Curiosamente há quem consiga apreciar vinhos assim. Experts sugerem que se a gravidade não for intensa que se experimente um pequeno gole. Quem sabe não se descobre novas emoções.
Na maioria dos casos, lixo!
5 – Aromas de estrebaria
Este defeito decorre da presença de uma levedura natural, bem comum nas vinícolas a Brettanomyces. Há quem a classifique como uma super-levedura e a utilize na fermentação alcoólica. Mas qualquer descuido pode estragar tudo. Em condições normais as leveduras selecionadas na elaboração de vinhos conseguem neutralizar este defeito sem muitos problemas. Um rígido controle da fase de fermentação e boa higiene da cantina são suficientes.
Se o aroma não for dos mais intensos a vinho pode ser consumido. Caso contrário, descarte.
6 – Outros defeitos menos comuns
Embora raros, podem aparecer diversos outros aromas ou sabores que listamos a seguir. Vinhos com estes defeitos são candidatos a não serem consumidos:
- sabor de água de piscina ou alvejantes decorrente de excesso de alcalinidade;
- aromas e sabores de “remédio” ou “fármacos”. Ocorre em vinhos cujas uvas estavam atacadas pela podridão produzida pela “botrytis cinérea” ou que tenham sido adulterados;
- sabores metálicos decorrente do contato com alguns metais que não deveriam estar presentes na fase de elaboração.
7 – Vinho sem aroma ou sabor
Comumente denominado de vinho fechado ou chato. Em geral é um vinho ainda muito jovem ou que foi transportado em condições muito rudes: está em choque.
Dê uma chance a ele e o esqueça no decantador por um par de dias. Se não resolver, descarte.

Dica da Semana:  este não tem defeitos!

Chakana Malbec Reserva 2011
Produtor: Bodegas Chakana, Mendoza, Argentina
Púrpura intenso com reflexos violáceos.
No nariz, revela notas de frutas secas como ameixa adornadas por notas de especiarias exóticas e toques de chocolate.
Na boca, apresenta ótima concentração de frutas e taninos bem equilibrados.
Acompanha churrasco, carnes assadas e defumadas, pratos condimentados e queijos maduros.

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Comprando um vinho desconhecido

Esta é uma situação típica: entramos numa loja de vinhos ou num supermercado e nos deparamos com rótulos desconhecidos. Qual devemos comprar?
Para responder esta pergunta precisamos nos fixar em alguns pontos muito importantes e que envolve um pouco de disciplina e autoconhecimento. Vamos explorar estes aspectos embarcando numa interessante aventura.
1 – Explicando a estrutura de um vinho.
Parece complicado, mas não é. Podemos resumir em 4 aspectos: Fruta, Acidez, Madeira e Tânino.
Fruta ou Vinho Frutado são aqueles em que predominam os aromas e sabores das frutas. Bebidas mais suaves que enganam o nosso paladar parecendo quase adocicadas.
Acidez é quase o oposto, são os vinhos transmitem uma sensação de aspereza, sem ser desagradável, percebida na lateral e no fundo da nossa língua. Nos fazem salivar. Típico dos brancos.
Madeira ou Vinho Madeirado são os que foram elaborados e ou amadurecidos em contato com Carvalho. Apresentam aromas bem característicos como baunilha, manteiga e tostado. Mais comum entre os tintos, mas há excelentes brancos com algumas destas características.
Tânicos são os vinhos que tem um característico amargor percebido no céu da boca (enrugamento) ou nas gengivas. Uma exclusividade dos tintos por serem elaborados com suas casacas.
A compreensão e identificação destes 4 tipos são um conhecimento básico para definir o que cada um de nós aprecia mais na sua bebida favorita. Isto nos leva ao próximo passo.
2 – Descobrindo o nosso “estilo de paladar”.
Lá no início destas coluninhas, na fase que muitos leitores apelidaram de “curso”, sugerimos que fossem feitas anotações relativas aos que estávamos consumindo. Desta forma elas poderiam ser úteis mais tarde. Vamos nos valer deste recurso acrescentado uma pequena tabela que irá relacionar, na experiência gustativa de cada um, os 4 pontos descritos acima em um vinho qualquer. Não precisa ser nada muito elaborado. Abaixo um exemplo que serve perfeitamente: (atribua notas de 1 a 10 para intensidade de cada item)
Nome: "Château do Tuty"
Casta: Cabernet Sauvignon (se for um corte anote a casta predominante)
Fruta – 6
Acidez – 4
Madeira – 5
Tanino – 7
Experimente diferentes vinhos e castas, brancos e tintos sem se preocupar com uma avaliação global do tipo bom/ruim ou gosto/não gosto. O importante é associar o paladar de cada um com os descritores sugeridos. Com algum tempo será possível perceber uma tendência, que será pessoal. Tente apenas lembrar se foi uma boa experiência ou não. Exemplo: as notas mais frequentes podem sugerir, para um apreciador de vinhos tintos, que o ideal seria tanino e madeira médios, predominância de fruta e baixa acidez.
3 – Entendendo o jargão do vinho.
Este passo vai nos ajudar a decifrar o que está escrito nos contra-rótulos ou em eventuais etiquetas de avaliação que costumam acompanhar as garrafas nas lojas especializadas.
Quase sempre os descritores utilizados estão associados a sabores ou aromas. Por exemplo: cítrico; achocolatado; etc..
Algumas são simples e diretas, mas o que falar de “terroso”, “mineral” ou “tabaco”? O melhor é pesquisar em livros ou na Internet as melhores explicações para estes termos. Uma boa conversa com alguém que seja mais experiente no tema, acompanhado de uma boa garrafa que produza a explicação desejada é a melhor lição.
4 – Usando os críticos a nosso favor.
Tornamos a repetir os nomes mais conhecidos: Robert Parker, Wine Spectator, Wine Enthusiast ou os nacionais Descorchados, Adega e Jorge Lucki que escreve no jornal Valor Econômico, em nossa opinião, o melhor crítico brasileiro. Com poucas exceções, empregam um sistema de 100 pontos para classificar os vinhos que analisam. Se o seu crítico preferido adota outro sistema basta uma aritmética simples para fazer a correlação.
Tudo que precisamos saber para escolher um bom vinho é que uma nota de 85 pontos representa uma faixa que engloba 15% dos melhores vinhos.
Com grande certeza, a maioria dos produtos encontrados numa loja especializada está abaixo desta faixa. Obviamente há uma relação direta entre preço e nota atribuída: quanto maior, mais caro.
5 – Escolhendo um vinho desconhecido.
Munidos de todas estas informações podemos partir para a última parte de nossa aventura. Escolham a loja e busquem pelos vinhos com esta nota base de 85 pontos.
Leiam os rótulos detalhadamente procurando por descrições como “taninos aveludados, boa fruta, envelhecido em Carvalho”, etc.. Usando nossas anotações, podemos filtrar corretamente o que nos interessa e fazer uma boa compra.
6 – Um Bônus.
Persistência é tudo que precisamos para dominar esta arte da boa compra. Mas há uma grande vantagem: podemos utilizar estas novas habilidades para presentear alguém que gostamos.
Já pensaram nisto?
Dica da Semana:  um francês, para variar...

Auguste Bessac Côtes du Rhône 2010
Côtes du Rhône é o vinho mais vendido da região sul do Vale do Rhône, um tinto de bom corpo, aromas de amora, framboesa, cassis e notas de especiarias.
Em boca é equilibrado e saboroso, possui taninos maduros e final duradouro.
Harmonização: Bife ancho, carne de panela com batatas, medalhão de alcatra, massas ao molho carbonara e cassoulet.