A coluna
desta semana tem como pano de fundo os e-mails de alguns leitores sobre a
experiência descrita na postagem anterior.
Basicamente,
notei certa austeridade com relação ao tipo de vinho consumido, uma
incredulidade com relação às massas e o tal negócio do ‘tem que’. Vamos quebrar
algumas regras, não se espantem.
A primeira
que vou jogar no lixo é o ‘tem que’:
Nenhum
vinho tem que harmonizar com nada!
As
tradicionais regras de harmonização, constantemente citadas aqui e em outras
publicações vinícolas, têm, por objetivo, fornecer sugestões - nada mais que
isto - para tornar a nossa experiência ao degustar um vinho em algo melhor. Mas
certamente podemos beber qualquer vinho apenas pensando na vida ou com um pão
fresquinho e manteiga. Garanto que vai combinar.
No momento
que algum enófilo botou na cabeça que este ou aquele caldo tem que ser
consumido ‘exatamente’ de uma maneira, estragou tudo! Degustar um bom vinho é
uma forma de quebrar regras, romper com tabus, sonhar, experimentar. Se der
errado, ótimo! Já sabemos o que não fazer na próxima oportunidade.
O segundo
tema que vou abordar, de modo resumido, é este respeito exagerado por um vinho
de sonho. Eu não consigo imaginar comprar ou ganhar uma daquelas garrafas que
existem na nossa imaginação e ficar o resto da vida olhando para ela. Vou
bebê-la mais cedo ou mais tarde. Pode até ser que eu espere uma ocasião
especial, mas o destino será o mesmo de uma garrafa comprada no supermercado
por uns poucos trocados.
Então onde
está a diferença?
Não há uma
resposta simples. Cada um vai ter uma experiência diferente com os vinhos que
provar. Gosto muito de citar a minha mulher. Ela resume nos 5 dedos de uma mão
tudo o que precisamos saber: tinto, branco, rosé, gosto e não gosto.
Muitas
vezes é difícil se apreciar um vinho se o nosso olfato e paladar não foi
devidamente treinado. Para isto, só com algum tempo de estrada. Somente então
seremos capazes de diferenciar (e apreciar) um Brunello de um Chianti, um
Bordeaux de um corte Bordalês qualquer, ou mesmo um bom vinho de boa relação
custo x benefício de uma caríssima garrafa que não tem um bom conteúdo.
Leva tempo,
mas vale a pena. É a partir deste ponto que valorizamos (alguns) vinhos
icônicos e ficamos muito satisfeitos quando conseguimos comprá-los ou
ganhá-los. Mas isto não pode virar um problema na hora de degustar. Mais uma
pequena aventura para solidificar estas ideias.
Numa outra
ocasião, a vítima era o Don Melchor, um ícone chileno. Um espetacular Cabernet
elaborado com uvas de diferentes vinhedos. Um amigo ganhou a garrafa e aquilo
quase virou uma batata quente. No barato custa R$ 400,00, mas não precisa de
pompa e circunstância para prová-lo. Respeito, e muito, quem o presenteou.
Combinamos
um almoço com mais um na mesa, três pessoas. Escolhemos um restaurante de
comida internacional. Como sempre, abrimos com um espumante, pães do tipo
italiano, presunto cru e burrata, tudo regado com bom azeite.
Uma
explicação: isto tudo tem a finalidade de preparar o palato para um tipo de
vinho com uma casta sabidamente tânica.
Tendo isto
em mente escolhemos os pratos:
Eu optei
por uma Paleta de Cordeiro;
O outro
convidado encarou um Osso Buco;
O dono da
garrafa arriscou optando por um elaborado espaguete com frutos do mar.
Os leitores
já devem estar elaborando quem acertou e quem errou. Eu posso falar com
segurança da minha parte: estava perfeito. Posso especular que o outro prato de
carne também foi uma boa harmonização. Mas só quem o consumiu pode avaliar.
Restou a massa e o dono da garrafa: pela expressão dele estava muito satisfeito
e ficou feliz com toda a experiência.
Mas o vinho
teve uma parte importante neste ‘causo’. Estava muito bom, com os taninos
perfeitamente arredondados, era muito frutado o que encobria a tal secura na
boca. Um senhor vinho como poucos que provei até hoje. Confesso que fiquei
tentado para deixar um pouco na taça e provar com uma mousse de chocolate na
sobremesa. Tenho certeza que ficaria ótimo.
Por fim o
capítulo "Massas".
Macarrão é
um alimento neutro, sem gosto marcante. Por esta razão é tão versátil. Mesmo os
do tipo recheados como Canelones, Raviólis, etc., nunca são intensos no seu
conteúdo, para permitir aos Chefs, profissionais ou domésticos, criarem os mais
sofisticados molhos. Acaba sendo um desafio para quem pretenda harmonizar. Mais
regrinhas a serem quebradas:
Não é
obrigatório um tinto italiano para acompanhar massas;
Tintos não
são a única opção.
Alguns
exemplos de massas que derrubam esta ‘ditadura’:
Massa com
frutos do mar;
Ravióli de
pera com molho de Brie (eu usaria um branco demi-sec);
Massas com
recheio ou molho de abóbora.
Um conselho
final: experimente!
Dica da
Semana: um ícone!
Coyam
Orgânico
Vinho
produzido por Vinhedos Emiliana, Chile, com: 41% Syrah, 29% Carménère, 20%
Merlot, 7% Cabernet Sauvignon, Mourvedre 2%, 1% Petit Verdot
Um vinho de
intensa coloração violeta, lembrando ameixa vermelha. Nariz que expressa aromas
de frutos vermelhos maduros, ameixas, amoras e frutas negras que fundem
elegantemente com notas de especiarias, terra, e um toque de baunilha doce. Bem
equilibrado e grande corpo no palato, com boa estrutura e taninos macios,
redondos.
Harmonização:
deve ser acompanhado por uma grande amplitude de pratos e sabores como: lombo
com batatas gratinadas, costelas de cabrito assado ao forno, entre outros.




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