sexta-feira, 24 de junho de 2011

Vencendo Preconceitos

Os leitores já estão imaginando que o escriba aqui enlouqueceu. Mas podem acreditar, bebedores de vinho são preconceituosos e alguns, supersticiosos. A propósito, há uma corrente entre os produtores de vinho, chamada biodinâmica, que está muito próxima disto.

Um dos preconceitos mais antigos é aquele que afirma: vinho é francês.

Em 24 de maio de 1976, na cidade de Paris, foi feita uma degustação, às cegas, comparando os mais famosos vinhos franceses com desconhecidos similares norte-americanos. Os nove juízes participantes eram de renome internacional. 

O resultado? 

As melhores notas foram dadas aos vinhos da Califórnia, brancos e tintos. Nunca mais os famosos vinhos da França seriam os mesmos, e o preconceito ou mito foi arrasado. 

Este episódio ficou conhecido como O Julgamento de Paris.

Outro alvo de atitudes preconceituosas são os vinhos brancos e os rosés. Há quem afirme, com muita segurança, que vinho branco não é vinho. 

Impressionante alguém acreditar nisto. Se encontrarem uma pessoa com estas ideias, fujam. Ela é uma fraude e não entende patavinas do assunto. Se há um vinho que se destaca e pode ser considerado como sofisticado e requintado, é o Champanhe. Não há nada igual no mundo da enologia. 

E o que é um Champanhe? Um vinho branco! E tem mais: alguns brancos tranquilos são únicos e chegam a ser mais famosos - e mais caros - do que os tintos.

O vinho rosé sofre do eterno preconceito de ser uma mistura de vinho branco com tinto. Há quem torça o nariz só de olhar para uma garrafa. E são sempre bonitas!

Alguns maus produtores vão obtê-lo a partir deste método (corte), mas os bons rosados são feitos a partir de uvas tintas de qualidade, diminuindo-se o tempo de contato das cascas durante a fase de maceração. 

A origem do problema está no seu esquecimento. Ninguém os produzia, sendo Portugal e França duas raras e boas exceções. Este vinho recentemente foi redescoberto e grandes vinícolas do novo mundo têm apresentado ótimos produtos. 
Querem se livrar de mais este preconceito? Experimentem! Bebe-se bem gelado, como um branco. Vão querer repetir!

A cisma da moda é com relação ao fechamento das garrafas, as famosas rolhas. Já existem as de material plástico, de vidro e até mesmo alguns métodos de fechamento bem curiosos como usar uma tampinha de refrigerante para selar espumantes. 

Mas a discussão toda gira em torno das tampas de rosca. Como podem imaginar, "isto é para vinho barato"... 

Digam isto para um produtor Neozelandês...

A origem desta implicância está na produção de cortiça, uma indústria 100% artesanal, dominada por Portugal que controla 50% da produção mundial. Por ser um produto de origem vegetal, com um ciclo longo de produção – cada Sobreiro produz uma camada que pode ser removida a cada 10 anos – é um dos segmentos mais vigiados com relação à proteção do meio ambiente o que apesar de louvável, implica em diminuição da produção e aumento de custos.

Para alguns produtores, notadamente Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, o custo da rolha tradicional se tornou proibitivo. 

Centros de pesquisas internacionais e universidades ligadas ao mundo do vinho começam a buscar alternativas e a tampa rosqueada, de alumínio, aparece como a melhor opção. 

E aí começou guerra. Argumentos são fortes em ambos os lados. 

Vamos resumi-los:

- evita que vinho fique bouchonée (com gosto de rolha);

- desaparecem os problemas com fungos e de oxidação por má vedação;

- dentro de certos parâmetros e apesar da perfeita vedação, o vinho pode envelhecer corretamente (é necessário alterar o processo de vinificação);

- perde-se o ritual de sacar a rolha, que tem o seu charme;

- se o processo de vinificação não for bem cuidado, podem aparecer aromas de sulfitos e outros indesejáveis, por falta da micro oxigenação, proporcionada pela rolha de cortiça.

Mas, está mudança é inevitável: dentro de 20 ou 30 anos a rosca será a regra. Só vinhos muito especiais ($$$) serão vedados com rolha.

A dica da semana é para detonar todo e qualquer preconceito:

Montes Cherub Rose - 2009
Produtor: Montes Alpha - Chile
Uva: Shiraz/Syrah
Muito fino e elegante, o Cherub é o primeiro rosado de altíssima qualidade na América do Sul e, por seu alto nível, estaria mais próximo da consagrada linha Montes Alpha. O Cherub não é elaborado a partir de sangria de vinhos tintos, mas de ótimas uvas Syrah especialmente cultivadas para sua produção. É elegante e classudo, com bastante frescor e um longo e complexo retrogosto. Tampa de rosca. RP – 88 pontos
Colaborou: Jose Paulo Gils
Saúde !

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Ah! Os acessórios...



Muitos leitores, gentilmente, classificaram estas primeiras colunas como um cursinho. Esta é a de número 16 e, daqui a pouco, vamos ser obrigados a emitir um diploma para cada um. Num curso de verdade, as aulas seriam complementadas com degustações de acordo com o tema, coisa que a tecnologia atual do Boletim ainda não permite. A dica da semana, de certa forma, supre esta deficiência, mas nem sempre está relacionada com o assunto discutido.

Hoje vai ser diferente. Não importa o vinho que vamos indicar lá no final. O conteúdo da coluna vai servir.

Começamos pelo acessório mais importante: 

O Saca-Rolhas

Há de todo tipo, tamanho e preço. Entre os enófilos, já virou símbolo de status. Há verdadeiras joias à venda. Os bons saca-rolhas devem ser pequenos, leves e eficientes no que se propõem fazer. Parece óbvio não? As aparências enganam. 

Muitos tipos simplesmente destroem a rolha ou não oferecem um apoio ou braço de alavanca que minimize o esforço necessário.

Em nossa opinião, o campeão é o tipo usado pela maioria dos garçons e maitres. Preferencialmente um conhecido como duplo estágio ou Sommelier. É completo, incluindo uma pequena lâmina que vai ajudar no corte da cápsula ou lacre. Seu único defeito é ser algo comum, nada importante.

Para aqueles que desejam algo mais sofisticado, o céu é o limite. Vejam as imagens a seguir.



Pela ordem, o Screwpull, que abre uma garrafa com dois movimentos, o modelo a pilha e o de ar comprimido.


Este aí em cima é um outro acessório importante, o abridor de lâminas paralelas, usado quando a rolha está em mau estado ou quebrou durante a primeira tentativa de extração. Exige algum treinamento para sua utilização correta, mas não é nenhum bicho de sete cabeças. 

Decantadores, aeradores e outros complementos 

Este é outro departamento em que há de tudo. Se valer um conselho, optem pelos mais baratos. A seguir alguns exemplos:


Quatro estilos de decantadores bem diferentes, mas que cumprem sua função. São frágeis, por isto mesmo recomendamos os mais simples. Quebrando, o prejuízo é menor.
Os aeradores estão na moda. São pequenos aparelhos que realizam, dinamicamente, o mesmo trabalho dos decantadores. Práticos e baratos. Abaixo alguns exemplos:


Pela ordem temos o Soirée, o Vinturi e o Wine Finer, muito anunciado por aqui.


Para aquela ocasião que uma garrafa não foi consumida integralmente, existe uma tampa à vácuo. A marca mais conhecida é Vacuvin. Este é um investimento que se paga rapidamente. Uma garrafa selada desta forma dura 4 a 5 dias.

Outros complementos úteis são um termômetro para vinhos e um corta pingos, em geral um disco metálico que é enrolado e introduzido no gargalo. Brinde muito comum em eventos de degustação.

Tá tudo aí?

Então vamos à dica da semana:

Dolcetto Monferrato Villa Jolanda 2008
Produtor: Santero / Piemonte - Itália
Uva: Dolcetto
Graduação Alcoólica: 12%
Um Dolcetto macio e cheio de fruta elaborado com competência por Santero. Combina boa acidez e fruta madura em um conjunto bastante equilibrado, ideal para acompanhar massas, pizzas e carnes.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Organizando uma Confraria


Junte os amigos, arraste os móveis, aumente o volume que a festa vai começar!

Mesmo com a ajuda do Google, não consegui descobrir quem usava este bordão. Acho que era de um show de rádio há muito tempo atrás.

Parafraseando o fabuloso Chacrinha – "tudo se copia" - não seremos nem um pouco originais adaptando o refrão aí em cima para explicar o que vai acontecer na coluna de hoje:

Junte os amigos, arrume a mesa e vamos beber um bom vinho.

Uma confraria é exatamente isto. Uma reunião para degustar as nossas descobertas, sem muitas regras, mas com algumas obrigações importantes. A primeira, e a mais importante de todas, é que a confraria, uma vez formada, se reúna regularmente e, a cada encontro, antes que todos tenham começado a provar as delícias do dia, deve-se agendar logo a próxima reunião. Caso contrário, a coisa desanda e fica sem graça.

Não pensem que, apesar de ser uma boa ideia, é fácil manter uma regularidade e o interesse dos confrades. Temos que ser criativos. Vamos examinar alguns pontos para que a empreitada tenha sucesso.

1 – O número de participantes é de suma importância e definirá o número de garrafas que serão apresentadas. Tecnicamente, 1 garrafa atenderia até 4 pessoas, servindo 2 taças de cerca de 100 ml. Numa prova de vinho, diminuindo sensivelmente a quantidade servida, é possível esticar até 8 ou 9 pessoas. Mas vamos apenas provar o vinho em vez de degustar. Procurem equilibrar o que cada um deve trazer. Tenham em mente que se a confraria crescer muito haverá outras implicações como necessidade de maior espaço, mais taças, etc.;

2 – Criar temas ou desafios para as reuniões é um caminho interessante. Eis algumas sugestões:

- escolham vinhos de determinadas regiões para serem comparados;

- fixem um limite de preço por garrafa e desafiem para saber quem fez a melhor compra;

- harmonizem comidas com vinhos de determinados país.

Enfim, as possibilidades são ilimitadas, o que não impede de se fazer a reunião em torno de um jogo de futebol, vôlei, basquete, corrida de moto ou F 1. O importante é tomar o vinho.

3 – o assunto $$ é sempre delicado e deve ser tratado abertamente. Dois caminhos funcionam muito bem: dividir a despesa, principalmente a do vinho; ou, a cada reunião, um confrade paga a conta;

4 – uma variação muito interessante é encarregar a um dos confrades uma pesquisa sobre o que vai ser bebido e, se for o caso, servido num jantar. Podem surgir histórias muito bacanas que vão gerar animados papos.

5 – ousem! 

- façam degustações às cegas: escondam os rótulos que serão bebidos e tentem descobrir o que é; 

- tentem uma degustação vertical: o mesmo vinho em diferentes safras; 

- ou façam uma horizontal:mesma uva, mesma safra, diferentes produtores;

Algumas confrarias, como a que frequentam três colunistas do Boletim, são simples e diretas, reunindo-se 1 vez por mês, em geral num restaurante, com a desculpa de comemorar os aniversários, mesmo que não haja nenhum... As únicas regras são: tragam a sua garrafa e dividam a despesa do aniversariante. 

Casualmente tem sido feitas algumas degustações às cegas, o que se provou ser muito divertido e difícil de acertar.

Outra confraria, da qual este escriba tem acesso, é bem mais sofisticada. As reuniões são mensais, sempre na casa de um confrade, que oferece o jantar e os vinhos. Há um limite mínimo no preço da bebida – neste caso específico US$ 100.00 – e cada encontro é temático e harmonizado. O anfitrião deve fazer uma breve exposição sobre que selecionou (ficha do vinho) e a respectiva harmonização.

Por fim, façam disto um prazer e não uma obrigação. Algo que todos desejam que aconteça novamente. Um bom nome para a confraria é um fator aglutinante. 

Dica da Semana:


Chapel Red 2009
Produtor: Robertson Winery / África do Sul
Uva: Merlot
Graduação Alcoólica: 14%
Saboroso tinto sul-africano de excelente relação qualidade/preço. Mostra cativantes aromas herbáceos e de frutas maduras. No palato é macio e envolvente, com ótimo equilíbrio.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

A propósito


Na última 6ª feira, na revista Rio Show, encartada no jornal O Globo, do Rio de Janeiro, a craque Deise Novakoski publicou uma interessante matéria em sua coluna ‘Três Doses Acima’. Sommelier respeitada e uma das primeiras bar woman, fala com muita propriedade sobre os efeitos do marketing nos rótulos da nossa bebida predileta.
“A grande maioria dos rótulos de vinhos parece feita para enlouquecer o consumidor. O que deveria ser um canal de comunicação entre nós e os produtores muitas vezes mais parece um recado mal anotado, uma sopa de letrinhas que nos induz a acreditar naquilo que não existe”.
Um dos exemplos clássicos citados por Deise é a confusão, propositadamente criada, quando se empregam, de forma indiscriminada, os termos Reserva e Reservado. Para o comprador leigo e desavisado, este seria um vinho de melhor qualidade e os termos se equivalem.
Ledo engano!
O vinho virou um produto de marketing, muito bem trabalhado. O negócio é vender, de preferência com preços altos, algumas vezes, exorbitantes. Já que a legislação é omissa ou inexistente, vamos aproveitar...
Só que não podemos generalizar. Volto a citar a matéria em tela:
“Inspirados pelas mesma fonte que, um dia, por questões culturais e de colonização, os fizeram usar tais classificações, produtores argentinos e chilenos estão solicitando uma legislação para o uso de tais palavras nos rótulos, baseada nos moldes da lei que classifica os vinhos em regiões como Rioja e Ribeira del Duero, na Espanha”.
O que tem de tão especial nesta legislação? É aqui que a coisa fica interessante. Estes vinhos são classificados segundo a qualidade das uvas e pelo tempo de amadurecimento em barris de madeira. Existem 3 categorias, que são alinhavadas a seguir:

Crianza – um vinho que passa pelo menos 2 anos nos barris. Deve ser um vinho leve, fácil de beber;

Reserva – mínimo de 3 anos barricado, mais encorpado, concentrado, ‘jugoso’ como eles gostam de falar;

Gran Reserva – no mínimo 5 anos de envelhecimento em barricas e, mesmo assim, só recebe a denominação caso a safra toda daquele ano tenha sido considerada excepcional. Tem que ser um produto de excelente qualidade, requintado.

Simples e direto, com o propósito de esclarecer o consumidor e não confundi-lo. Muito diferente dos rótulos que encontramos por aqui, que além das expressões já citados, são acompanhadas por denominações como, Premium, Reserva Varietal, Gran Cuvèe e quejandos. No máximo indicam (com muita boa vontade) um maior teor alcóolico. Mas o precinho...

Então não caiam neste novo conto do vinho ao montar sua adega. Invistam em produtos que sabidamente são de boa qualidade, optem por denominações tipo DOC ou IGT. 

Caso tenham encontrado um vinho do qual gostem e tem boa relação custo x benefício, mesmo que receba uma destas denominações duvidosas, contem para a gente.

Em tempo: a denominação Reserva é a habitual para vinhos superiores aos não denominados. Reservado é jogada de marketing... 

Dica da semana:

Infinitus Cabernet Sauvignon /Tempranillo 2007
Produtor: Martínez Bujanda, Espanha
Região: Castilla y León
Uva: Cabernet Sauvignon, Tempranillo
Graduação Alcoólica: 14%
Saboroso tinto produzido por Cosecheros y Criadores, dos mesmos proprietários das Bodegas Martínez Bujanda. O Infinitus é afinado em barricas de carvalho americano, resultando em um vinho macio e envolvente, de ótima relação qualidade/preço, perfeito para o dia a dia.