sexta-feira, 27 de maio de 2011

Montando uma adega

Todo enófilo que se preze tem entre seus objetivos a montagem de uma adega. Não importa o tamanho, o importante é ter, ao alcance da mão, os vinhos que mais aprecia. Se levarmos em conta que uma adega clássica é composta por representantes dos brancos, rosés, tintos, além dos fortificados, doces, espumantes e outras coisinhas, o número de garrafas pode chegar a uma centena.

Este volume, mesmo para um apaixonado por vinhos, pode ser um investimento considerável, sem falar no espaço e climatização necessária. Mas é perfeitamente viável criar uma adega básica, que vai atender principalmente ao nosso paladar. 

O que vamos adegar então? 

Os vinhos que conhecemos e nos dão prazer! 

Apresentaremos, a seguir, uma pequena lista com sugestões para organizar uma adega básica. Não vamos indicar nenhum vinho especificamente, mas somente os tipos de vinhos. 

Espumantes – para uma adega tradicional seria imprescindível um bom Champagne (francês). Nos dias de hoje, dando um caráter contemporâneo a esta coleção, prefiram os Proseccos, são como curingas do baralho ou os espumantes nacionais, fazem bonito em qualquer lugar do mundo (deixe para comprar o Champagne numa ocasião muito especial...). 

Brancos – Chardonnay e Sauvignon Blanc são obrigatórios, seja no perfil clássico ou no contemporâneo. Se o caixa permitir, aposte em mais um varietal. O Torrontés argentino é a bola da vez. Pinot Grigio e Viognier são outras boas escolhas. Para uma linha mais clássica, aposte nos Rieslings e Gerwurztraminers.

Tintos – Estes devem ser a maioria. Tenham, sempre, uma garrafa de um vinho tipo Bordeaux. Pode, perfeitamente, vir da Argentina ou do Chile, escolhas com boa relação custo x benefício. As coleções de tintos atuais trilham o caminho das varietais. Escolham as suas prediletas entre Malbec, Syrah, Merlot, Cabernet Sauvignon, Touriga Nacional, Tempranillo, Sangiovese, etc. 

Um luxo que vale a pena e justifica a existência da adega é adquirir alguns vinhos de guarda. Apostem nos vinhos do velho mundo. Vinhos de 1ª linha, sul-americanos, também se prestam a desempenhar este papel. Para não errar, peçam ajuda na hora de comprar. Nem todo vinho pode ser guardado por longos períodos. 

Fortificados e de Sobremesa – Um bom Porto é essencial, tinto ou branco. Os vinhos de sobremesa, chamados de colheita tardia (late harvest) estão muito comuns hoje em dia, mas raramente são abertos e consumidos. Pensem duas vezes antes de incluir um no estoque. 

Outras sugestões:

- Um Rosé pode ser muito útil naquele momento de indecisão; 

- Para dar um toque bem interessante, acrescente um dos destilados de vinho -  Conhaque, Bagaceira, Grappa, ou assemelhados. Na hora certa, tornam-se coadjuvantes importantes numa boa refeição, mas só para os que vivem em climas frios... 

Onde e como guardar?

Poderíamos chamar este parágrafo de "Protegendo seu Investimento". Brincando, brincando, o nosso kit básico pode chegar a algo entre 10 a 20 garrafas, dependendo da disposição de gastar de cada um. Aliás, não comprem tudo de uma vez e reponham sempre que consumirem. 

O lugar ideal de guarda deve ser um local seco, arejado e fresco. Em hipótese nenhuma pode pegar sol. As garrafas devem ficar deitadas, molhando a rolha.

Existe uma infinidade de móveis projetados para este fim, o mais comum é na forma de uma treliça onde em cada nicho fica uma garrafa. Se existirem crianças em casa, optem por uma solução com porta ou de difícil acesso. Muito comum hoje são as adegas climatizadas, oferecidas em diversas capacidades. 

Práticas, mas um luxo nem sempre necessário, além de caras. Exigem o mesmo cuidado como o de uma geladeira comum. Uma alternativa, para aqueles que optarem por este tipo de solução é adaptar um refrigerador velho. Pode ficar muito charmoso e mais em conta.
Dica da Semana: Para começar a coleção, um vinho que pode ser tomado hoje ou guardado por até 5 anos.

Casa Lapostolle - Cabernet Sauvignon 2009 – Chile 
Um vinho que já foi eleito simplesmente como o Melhor Best Buy do Ano no mundo todo para a revista Wine Enthusiast, ele é intenso e pleno, um Cabernet com toda a força. Traz uma maturidade e uma qualidade raramente alcançada por outros na mesma faixa de preços, diz a revista. 
Harmonização sugerida - Carnes grelhadas e cordeiros. 
Wine Spectator: 87 pontos (06) 
Wine Enthusiast: 88 pontos (06) 
Best Buy Wine Spectator: 86 (07)



A foto a seguir mostra um pedacinho da adega do Boletim, onde testamos os vinhos da semana. 


Saúde!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Harmonia! Harmonia! – Final


As Combinações Clássicas

Algumas são mais que conhecidas. Nem por isto podem ser consideradas como definitivas. Haverá, sempre, uma nova harmonização a ser descoberta. Então, experimente!

Peixes e Frutos do Mar:

Ostras e Mariscos - Espumante Brut, preferencialmente Champanhe ou um bom Chablis;


Peixes crus, grelhados ou com molho suave - brancos jovens frutados, o Sauvignon Blanc e o Chardonnay reinam aqui. Espumante pode ser uma opção interessante;

Com molhos pesados - branco maduro, tinto jovem, rosé;

Anchova, Atum, Salmão, Sardinha e peixes levemente defumados - tintos jovens de corpo médio, brancos madeirados ou barricados, rosés com boa estrutura;

Bacalhau *** - bom branco envelhecido em carvalho, Chardonnay preferencialmente, ou um tinto jovem, de corpo médio. Há ainda uma opção muito sofisticada – Pinot Noir da região de Alto Ádige, Itália.

Carnes Brancas (aves):

Aves Grelhados ou Assados, molho suave - espumantes, brancos estruturados ou maduros, tintos jovens;

Molhos pesados - tintos maduros de corpo médios a encorpados;

Pato, Marreco, aves de caça - tintos maduros de corpo médio a encorpados;

Arroz de Pato - Pinot da Borgonha;

Peru - tinto leve a médio ou branco maduro.

Carnes Vermelhas:

Grelhados ou Assados, molho suave - espumantes, tintos jovens;

Molhos pesados, caças - tintos encorpados;

Churrasco - Malbec, Tempranillo, Tannat, Cabernet Sauvignon – quanto mais gorda a carne, mais tanino no vinho;

Massas:

Em molhos leves ou brancos - espumantes, brancos de boa qualidade, tintos leves e jovens;

Em molhos vermelhos ou condimentados - tintos maduros e encorpados, alguns espumantes. Destacam-se os vinhos italianos como o Chianti, o Barolo ou Nebbiolo;

Alho e Óleo - Prefira um vinho mais leve.

Queijos (muitos leitores vão se surpreender aqui):

Minas Frescal, Ricota, Requeijão, Mozzarela - vinhos leves e jovens, brancos ou tintos;

Brie, Camembert e assemelhados - branco maduro (Chardonnay), tintos;

Emmental, Gouda, Reino, Prato, Saint-Paulin, Tilsit, Port-Salut - tintos maduros e encorpados;

Provolone - branco maduro, tinto de corpo médio;

Roquefort, Gorgonzola e assemelhados - tintos maduros, brancos doces de qualidade, fortificados;

Parmesão, Pecorino - tintos maduros, fortificados.

Patés - brancos doces de qualidade, fortificados doces.

*** Bacalhau: aqui cabe uma historinha – tradicionalmente este prato era acompanhado por um tinto de Portugal. Existe uma razão; não se faziam bons brancos por lá até algum tempo atrás. Hoje esta regra foi abandonada.

Curiosidade – espumantes, de boa qualidade, combinam com todos estes queijos ou patés.

As Incompatibilidades: 

- temperos fortes como curry, azeite de dendê, molho de soja, wasabi; 

- alcachofra, aspargos, couve, repolhos etc; 

- ovo de galinha, codorna ou pato; vinagre, frutas cítricas como limão, grapefruit (toranja) e similares.

- chocolate – aqui a controvérsia é grande. Há quem afirme que não combina com nenhum vinho. Alguns enogastrônomos harmonizam com Vinho do Porto ou um vinho doce francês chamado Banyuls. 

Dentro da estratégia de contrastar, experimentei uma mousse de ricota, canela e chocolate, servida com um potente Malbec, vinho top da vinícola que visitávamos. Simplesmente a combinação perfeita.

Desafio para os leitores: Feijoada combina com vinho? Qual? Garanto que há uma resposta escondida no texto... 

Dica da Semana:
Tegole IGT Toscana 2004 Piccini
Produtor: Piccini - Itália
Região: Toscana
Uva: Sangiovese
Um belo Sangiovese, marcante e saboroso, com um bouquet repleto de frutas maduras. Ótimo para acompanhar pratos de carne ou massas.
Saúde!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Harmonia! Harmonia! - 2ª parte

De vinhos leves a vinhos encorpados

O fator predominante para dar peso a um vinho é o seu teor alcoólico, item declarado em todos os rótulos, portanto, indicação de fácil constatação:

Vinhos leves – teor alcoólico entre 8% e 9%
Vinhos médios – teor alcoólico entre 10% e 12%
Vinhos encorpados – teor alcoólico entre 14% e 17%

Mas isto só não basta. A relação a seguir, classifica os vinhos por seu corpo, aliado à uva, região produtora ou tipo de vinho: (existem exceções)

Brancos leves: Pinot gris, Pinot blanc, Riesling, Sauvignon blanc, Chablis, Champanhe e outros espumantes, Gruner Veltliner, Vinho Verde;

Brancos médios a encorpados: Sauvignon blanc envelhecido em Carvalho, Vinhos da Alsácia (Riesiling), Albarino, Bordeaux branco (Semillon), Borgonha branco (Chardonnay), Vinhos do Rhone brancos (Viognier, Roussanne, Marsanne), Tamaioasa Romaneasca e Chardonnay do Novo Mundo (Chile, Argentina, Austrália, Nova Zelândia);

Tintos Leves: Beaujolais, Dolcetto, alguns Pinot Noir;

Tintos médios: Chianti, Barbera, Borgonhas, Chinon, Rioja (Garnacha, Graciano, Mazuelo e Tempranillo), Cabernet Franc, Merlot, Malbec Frances, Zinfandel ou Primitivo, outros Pinot Noir;

Tintos encorpados: Syrah, Brunello di Montalcino, Cabernet Sauvignon, Porto, Barbaresco, Barolo e Nebbiolo, Tintos do Novo Mundo (Malbec, Carmenére, Tannat).

Obter um perfeito equilíbrio entre alimento e vinho só é possível do ponto de vista teórico. Na prática, um ou outro vai sobressair. Uma boa ideia de como isto realmente funciona é observar uma conversa entre duas pessoas: enquanto uma expõe seu ponto de vista, a outra escuta. Caso contrário, torna-se um caos. Se vamos realçar o prato, escolha um vinho mais suave. Se o que se pretende é evidenciar o vinho, escolha um prato mais leve.

Combinar ou Contrastar?

Além de analisarmos pesos e estruturas, precisamos escolher uma estratégia para que este casamento funcione. A clássica é combinar. Exemplo: um Chardonnay envelhecido, que tem um sabor amanteigado, é a escolha certa para pratos com molhos elaborados com manteiga ou azeite.

Já a culinária contemporânea prefere contrastar vinhos e sabores, usando o velho princípio de que opostos se atraem. Neste caso, um ácido e cítrico Sauvignon Blanc é a escolha para acompanhar um belo linguado com molho cremoso e alguma gotas de limão.

Na última parte desta série apresentaremos algumas combinações e incompatibilidades clássicas.

Para os leitores começarem a fazer suas experiências, que tal harmonizar a dica de hoje? Cartas para a redação... 

Paulo Laureano Premium Tinto 2008
País: Portugal – Alentejo (DOC)
 Produtor: Paulo Laureano Vinus
Castas: 20% Alicante Bouschet, 40% Aragonez, 40% Trincadeira
Compotas de frutos negros onde se distinguem ameixas e amoras silvestres em compota, mesclados com notas de chocolate negro, tosta e fumados das barricas. Estrutura marcante onde se sobressaem os taninos das castas e da madeira de estágio, de forma harmoniosa e complexa. Estagiou 6 meses em barricas de carvalho francês. 
Saúde!

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Harmonia! Harmonia! - 1ª parte



O leitor já está imaginando que a coluna desta semana será sobre Escola de Samba, afinal, Harmonia é um dos quesitos julgados no espetacular desfile, definido como a perfeita igualdade do canto do Samba-Enredo, pelos componentes da Escola....

E o que isto tem a ver com vinho?

Harmonizar uma refeição, alimentos x bebidas, tem a mesma definição do quesito descrito acima, guardada as devidas proporções: a perfeita igualdade....
Não pensem que é fácil. Alguns alimentos não combinam com nenhum vinho, enquanto outros podem ser acompanhados por vários tipos de bebidas.

Existe uma regra que é quase uma lenda, a que combina a cor dos alimentos com a cor do vinho a ser servido: carnes vermelhas, vinhos tintos, carnes brancas, vinho branco. Este é um conceito, apesar de imperfeito, bastante popular. Em linhas gerais, funciona.

Vamos complicar as coisas um pouco: qual o tipo de vinho tinto deve ser servido num churrasco ou numa macarronada, por exemplo?

A solução deste enigma nos leva a outra regrinha, a que sugere harmonizar um vinho originário do país (produtor) com suas comidas típicas. O churrasco, comum na Argentina ou Uruguai, seria muito bem complementado com um Malbec ou Tannat. Mas outros vinhos cumpririam esta missão, o espanhol Tempranillo e o internacional Cabernet são opções conhecidas.

Então qual é a regra certa?

Para sermos muito honestos com os leitores a melhor resposta seria não existe. Mas podemos apontar alguns caminhos a serem seguidos.

O problema todo esbarra em diferenças culturais. Paladares são subjetivos e pessoais. Um mesmo vinho pode ser classificado de forma diametralmente oposta por duas pessoas de nacionalidades ou sexo diferentes.

Para tentar contornar esta diferença, alguns autores demonstram que o casamento entre determinado alimento e um vinho é regido por um fator bem conhecido: o corpo do alimento e do vinho.

Corpo, numa refeição, significa forma de cozimento (ou não), textura, quantidade de gordura e sabores predominantes, enquanto que, no vinho, estamos nos referindo ao teor alcoólico, acidez, taninos e açucares.

Assim, à primeira vista, parece confuso. Mas não é. Trocando isto em miúdos, esta explicação acima pode muito bem ser traduzida por:

Comidas pesadas – vinhos encorpados
Comidas leves – vinhos leves.

Na próxima semana vamos mostrar como se classificam os vinhos por seu corpo, e abordaremos as duas estratégias básicas: combinar e contrastar.

Enquanto isto, para acompanhar a macarronada de domingo, eis a dica da semana:

Sangiovese di Toscana 2009 – Bonacchi
País: Itália
Região: Toscana
Uva: Sangiovese
Um tinto fresco e agradável, elaborado com uvas Sangiovese plantadas nos mesmos terrenos que dão origem aos Chianti. Ótimo para acompanhar massas, carnes e aves.
Saúde!